“São Paulo foi convertido pela visão de Cristo Ressuscitado.” Quando meditamos sobre a conversão de São Paulo, podemos nos perguntar: por que ele havia necessitade de conversão se era um homem tão fiel à lei de Deus, tão ardente defensor dos costumes judaicos? Ora, converter-se, como sabemos, é mudar de direção: Paulo percorria seu próprio caminho ao perseguir a Igreja, e acreditava ser essa a vontade de Deus, mas o próprio Jesus Ressuscitado veio ao seu encontro e derrubou-o por terra. Quando lemos e rezamos com a passagem de Atos 9, onde São Lucas nos narra com uma riqueza de detalhes impressionante a conversão de Saulo de Tarso, o que contemplamos não é apenas um homem que cai por terra por causa de uma visão celestial. O que vemos é o ser inteiro de Saulo ser despedaçado, jogado por terra. Todas as suas certezas, convicções mais profundas, esperanças, seguranças, tudo isso foi jogado no chão em um momento pelo encontro com Cristo Ressuscitado. Saulo – o agora apóstolo Paulo! – morre e ressuscita com Cristo.
Segundo o Santo Padre Bento XVI, “o Cristo Ressuscitado aparece como uma Luz esplêndida e fala a Saulo, transformando seu pensamento e toda sua vida. O esplendor do Ressuscitado o torna cego: torna-se visível exteriormente a sua realidade interior, a sua cegueira com relação à verdade, a Luz que é Cristo. Depois o seu “sim” definitivo ao Cristo pelo Batismo abre de novo seus olhos, e o faz realmente ver.” Paulo passou três dias como que “morto”, e no terceiro dia ele ressuscita com Cristo pelo Batismo e a experiência do Espírito Santo. O apóstolo torna-se testemunha da Ressurreição de Cristo porque viveu esse evento pelo interior, foi associado no seu próprio ser ao Mistério Pascal. São Paulo não prega apenas algo que escutou nem muito menos uma doutrina coerente: ele prega o mistério de Cristo no qual todo o seu ser foi mergulhado, batizado, recriado! Depois de ver Jesus Ressuscitado, e de viver no seu íntimo o mistério pascal, Paulo “considerará como ‘lixo’ tudo o que antes se constituía para ele o ideal mais elevado, quase a razão de ser de sua existência.” Ele passa a conhecer Jesus. Sabemos que conhecer, segundo as Escrituras, é fazer a experiência, viver o mistério. A aparição de Jesus Ressuscitado é o fundamento de seu apostolado e de sua vida nova.
“O mistério pascal consiste no fato de que o Crucificado ressuscitou no terceiro dia conforme as Escrituras , segundo o que atesta a Tradição proto-cristã. É aí que se encontra o cerne da Cristologia Paulina: tudo gira em torno desse centro de gravidade. Todo o ensinamento do apóstolo Paulo parte e desemboca sempre no mistério Daquele que o Pai ressuscitou dentre os mortos. A Ressurreição é o acontecimento fundamental sobre o qual Paulo faz seu anúncio (Kerigma).” Sim, São Paulo não constrói sua vida sobre a areia de suas certezas e convicções: toda a sua vida, missão e pregação jorram do Ressuscitado. Aqui temos um exemplo vivo do chamado a antes SER para que o “fazer” tenha peso de eternidade: todas as ações de Paulo jorram do seu ser recriado em Cristo, refeito na experiência da Ressurreição, e isso o fará gritar que “nem a morte nem a vida, nem os anjos nem os principados, nem o presente nem o futuro, nem os poderes nem a altura, nem a profundeza, nem qualquer outra criatura poderá nos separar do Amor de Deus manifestado em Jesus Cristo, Nosso Senhor.”
Nós também ressuscitaremos!
No capítulo 15 da Primeira Carta aos Coríntios, São Paulo desenvolverá toda uma doutrina sobre a Ressurreição dos mortos. Nós também ressuscitaremos! Cristo ressuscitou e nos associou a Ele, a fim de que nós vivamos, a cada dia, esse processo de morte e de vida, de cruz e de ressurreição. A cada dia o homem velho, escravo do pecado e do egoísmo, morre mais, e o homem novo, recriado à imagem de Cristo, se fortalece. Por isso, “Se Cristo não ressuscitou, vazia é a nossa pregação, vazia é também a nossa fé.(...) Mas não! Cristo ressuscitou dos mortos, primícias dos que adormeceram.” Nesse testemunho que toda a vida e as palavras de Paulo fazem, tudo se contrói sobre esse fato, esse evento histórico, como nos lembra o Papa Bento XVI. “Nós vemos nos Atos dos Apóstolos e nas cartas que o ponto essencial da vida de Paulo é ser testemunha da Ressurreição.”
Lembra-nos ainda o nosso Santo Padre: “Tudo isso comporta importantes consequências para a nossa vida de fé: nós somos chamados a participarmos até o mais profundo do nosso ser a todo o evento da Morte e Ressurreição de Cristo.” Por isso, não existe vida cristã séria e coerente sem sofrimento, renúncia, purificação, perseguição, dor, lágrimas, que abrem as portas para uma fecunda e poderosa ressurreição. “A teologia da Cruz não é uma teoria, ela é a realidade da vida cristã. Viver a fé em Cristo, viver a verdade e o amor implicam renúncias cotidianas, implicam sofrimentos. O cristianismo não é uma via de facilidades; ele é uma ascensão exigente, no entanto iluminada por Cristo e fundada na grande esperança que nasce Dele.” São Francisco de Assis dizia que aquele que não conhece o Crucificado não sabe nada do Ressuscitado. O próprio Jesus disse a Ananias, que foi enviado para batizar Paulo, que “mostraria a Paulo o quanto seria preciso sofrer em favor do Seu Nome.”
São Paulo testemunhou com todo seu ser a ressurreição de Cristo também porque morreu para si mesmo. Existe o testemunho que é fruto da experiência de ser salvo, justificado e recriado por Jesus Ressuscitado, mas existe o testemunho que coroa toda uma vida doada: o martírio. Quem morre para si, vive para Deus. Quem morre para si, fecunda almas para Jesus. Paulo se alegrava nos sofrimentos que tinha sido achado digno de sofrer pelo Seu Senhor. O Padre Raniero Cantalamessa diz que apenas se dá a vida por aquilo que se crê no mais profundo das entranhas. A experiência que Paulo tinha de Jesus, o seu relacionamento com Jesus era entranhado, era toda a sua vida. Por isso, a única medida de seu testemunho era o dom total da própria vida. Doía para Paulo ainda não ter dado tudo, isto é, a vida. Daí o grito que ressoa até aos nossos dias: “Para mim o viver é Cristo, e o morrer é lucro”
Amo imaginar como deveria ser carregado de emoção o grito que São Paulo fazia quando anunciava o Evangelho: “Cristo Ressuscitou! Eu sei, eu o vi, Ele me tocou, me transformou, curou minha cegueira, hoje já não sou mais eu quem vivo, mas é Ele quem vive em mim! Ele me amou e se entregou por mim!” Que esse grito, tornado testemunho perene pelo derramamento de seu sangue, chegue até os nossos corações e nos faça gritar também, proclamar com a nossa vida e nossa morte, que Cristo ressuscitou, pois afinal de contas, nós somos hoje a voz do Cristo que Ressuscitado está. Que todo homem ouça esse brado! Amém.
Missionário da Comunidade Católica Shalom
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