Ações Abomináveis do Dinheiro

“Nada suscitou nos homens tantas ignomínias como o dinheiro. É capaz de arruinar cidades de expulsar os homens de seus lares; seduz e deturpa o espírito nobre dos justos, levando-os ações abomináveis. Ensina ao mortal os caminhos da astúcia e da perfídia e o induz a realizar obras amaldiçoadas pelos deuses”.

Sófocles (496-406 a.C.)
Filósofo e Dramaturgo grego

Vários especialistas do século XX acreditavam que os avanços na ciência e na tecnologia libertariam as pessoas do tédio do trabalho e marcariam o inicio de “uma era de lazer sem precedentes”. No inicio da década de 30, o intelectual britânico e o primeiro diretor-geral da Unesco Julian Huxley (1887-1975), previu que no futuro ninguém precisaria trabalhar mais do que dois dias por semanas. Walter Gifford (1885-1966), o famoso presidente americano da AT & T Corporation de 1925-1948, declarou que a tecnologia daria a “todo o homem a chance de fazer o que quisesse..., o tempo para aprimorar-se na arte de viver [e] para se dedicar mais atividades que satisfizessem à mente e o espírito”.
Mas que dizer das aspirações, materiais das pessoas? O renomado sociólogo americano Henry Fairchild (1880-1956) orgulhou-se em dizer que, “mesmo funcionando... no máximo quatro horas por dia”, as indústrias poderiam “fabricar mais produtos do que as pessoas conseguiriam usar”. Será que essas predições se tornaram realidade? O crescimento econômico durante os séculos XX e XXI foi realmente astronômico. Em teoria isso deveria ter reduzido á carga de trabalho de modo significativo. Mas o que tem acontecido? O premiado cineasta americano de documentários John de Graaf escreveu: “[As pessoas] têm colhido todos os benefícios de sua produtividade na forma de mais dinheiro - ou mais bens se preferir -, mas nenhum beneficio na forma de mais tempo. Dito de modo simples, nossa sociedade tem dado mais valor ao dinheiro do que ao tempo”.

“O dinheiro alterou até o ritmo engendrado por Deus para a sua criação. Pois Deus tendo trabalhado seis dias descansou no sétimo. Já o dinheiro não dá descanso a ninguém. Há apenas alguns anos, as pessoas poderiam ganhar o pão de cada dia trabalhando, grosso modo oito horas por dia. Mas, com o advento das modernas tecnologias de comunicação, esse tempo social lento foi para o espaço. A liquidação da fatura veio com a globalização financeira, interligou o planeta em um só cassino. Hoje, os especuladores mundiais têm a sua disposição 86.400 segundos por dias para agir. Os seus representantes estão espalhados pelo vários paises, de tal forma que, quando uma bolsa de apostas abre em um local, no outro ela acabou de fechar, e assim sucessivamente. Na sociedade materialista mais do que nunca, tempo é dinheiro. O movimento lento da Terra ao redor do sol agora está potencializada na velocidade de átimos de segundos, que é o tempo suficiente para o dinheiro transferir-se de uma praça para outra”, escreve Ednaldo Michellon, doutor em ciências econômicas pela Universidade Estadual de Campinas-Unicamp e pela Universidade da Califórnia – EUA (1).

CAMPANHA DA FRATERNIDADE

“A raiz de todos os males é o amor ao dinheiro, por cujo desenfreado desejo alguns se afastaram da fé, e a si mesmo se afligem com múltiplos tormentos”.
São Paulo Apóstolo - Missionário e Teólogo da Igreja

As Igrejas Cristãs do Brasil - CONIC, apresentam a Campanha da Fraternidade e Ecumênica de 2010 com o tema Economia e Vida e o lema “Vocês não podem servir a Deus e ao dinheiro” (Mt 6,24). Esta Campanha tem como objetivo geral: “Colaborar na promoção de uma economia a serviço da vida, fundamentada no ideal da cultura da paz, a partir do esforço conjunto das Igrejas Cristãs e de pessoas de boa vontade, para que todos contribuam na construção do bem comum em vista de uma sociedade sem exclusão”.
Nesta Campanha da Fraternidade Ecumênica, as comunidades cristãs são convocadas a deixar-se interpelas pelas palavras de Jesus. “Não acumuleis para vós tesouros na terra”. Onde as traças e os vermes arruínam tudo onde os ladrões arrombam as paredes para roubar. “Mas acumulai para vós tesouro no céu” (Mt 6,19-20 A). “Ninguém pode servir a dois senhores: ou odiará a um e amará o outro, ou se apegará a um e desprezará a outro. Não podeis servir a Deus e ao dinheiro (Mt 6,24). Toda a vida de Jesus foi um testemunho de simplicidade no uso dos bens materiais de solidariedade com os pobres, de distribuição gratuita dos dons de Deus.
Toda a vida econômica deveria ser orientada por princípios éticos. A medida ética fundamental para qualquer econômico e um sistema que deveria criar reais condições de segurança e oportunidades de desenvolvimento da vida de todas as pessoas desde os mais pobres e vulneráveis. A sociedade, incluindo a ação governamental, tem a obrigação moral de garantir oportunidades iguais, satisfazer as necessidades básicas das pessoas, e o buscar a justiça na vida econômica.

POBREZA E FOME

A crise econômica global levará 100 milhões de pessoas à pobreza este ano, em função de perdas de empregos de redução de ganhos, levando um sexto da população mundial a fome, disse uma agência da ONU.
A Organização das Nações Unidas para a Agricultura a Alimentação – FAO prevê que o número de pessoas que passam fome chegará a um recorde de 1,02 bilhão este ano, sendo esta situação exacerbada pela alta persistente dos preços dos produtos alimentícios básicos a partir da crise alimentícia de 2006-2008.
No Ceará, quase um milhão de pessoas estão mergulhadas em extrema indigência. Entre nascimentos de risco e óbitos prováveis, são 991,120 pessoas que tentam seguir vivendo com 1/8 de salário mínimo por mês. Representam 11,86% da população do Estado, que agora ocupa o 3º lugar no ranking da indigência no país . Só perde para a Bahia, triste campeã com 1,274 milhão e para a maranhão, com a 1,078 milhão de habitantes em situação de extrema indigência.
Na história humana que marcada por ambições, explorações, injustiças e ganância, a Bíblia se volta decididamente para a defesa dos pobres: “Não falsificarás o direito do pobre no seu processo” (Ex 23.6).
Escreve São Paulo Apóstolo: “Aos ricos deste mundo, exorta-os que não sejam orgulhosos, nem coloquem sua esperança na instabilidade da riqueza, mas em Deus que nos provê tudo com abundância para que nos alegremos. Que eles façam o bem se enriqueçam com boas obras, sejam pródigos, capazes de partilhar” (1Tm 6,17.18). O maior orador romano e grande pensador político Cícero (106-43 a.C.) afirmou de modo magistral : “Nada é mais revelado de um espírito pequeno e mesquinho do que o amor á riqueza; nada mais honorável do que desprezar o dinheiro se você não o possui; mas dedica-la á beneficência se você o possui”.


CONCLUSÃO

A Bíblia apresenta Deus como Senhor e doador dos bens da Criação: “Do Senhor é a terra e suas riquezas, o mundo e seus habitantes” (Sl 24,1 e 1Cor 10,26). É Deus quem entrega a terra aos seres humanos. Nós a recebemos para nela viver um tempo e passá-la ás gerações futuras. “Darei em propriedade perene a ti e á tua descendência depois de ti, a terra das tuas migrações’’- diz Deus a Abraão (Gn 17,8). A Deus são oferecidas as primícias da terra como ato de culto e reconhecimento de seu direito como Senhor de tudo (Dt 26,10).
A criação não é propriedade dos seres humanos, mas os seres humanos pertencem à criação e a criação é de Deus. Sendo de Deus ela deve servir igualmente a todos os seus filhos e filhas. Que Pai ficaria contente vendo um filho se apropriar de tudo que é da família e deixando os irmãos na miséria? O teólogo alemão Martinho Lutero (1483-1546) pregava três tipos de convenções: “A conversão do coração, a da mente e a bolsa”.
Só é verdadeiramente convertido a fé cristã aquele que pratica a caridade. O rico cristão recebeu o talento do Pai Eterno para saber multiplicar seus bens em prol do seu semelhante. Se não colocar o seu talento e sua riqueza para ajudar os pobres, tornar-se um traidor de Deus e um maldito.
Que todos tenham consciência de colocar pouco ou muito, conforme as suas posses econômicas em favor do seu próximo. Vamos impregnar em nossa sociedade a cultura do bem e da partilha. Partilhar o bem dá verdadeiramente sentido real de felicidade à vida.

Pe. Inacio José do Vale
Professor de História da Igreja
Especialista em Ciência Social da Religião
E-mail: pe.inaciojose.osbm@hotmail.com

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